sexta-feira, 25 de julho de 2025

Os dois sacrifícios



Sócrates como o poeta que abandona a vida para provar seu ponto; que cede aos caprichos dos governantes, mesmo podendo escolher o exílio; leva ao limite sua doutrina, sua posição, leva ao limite a consciência de ser apenas uma gota no oceano, apenas mais um grão de areia na praia (a morte que poderia ser evitada é o corolário da ideia de que "só sei que nada sei"). Nesse sentido, Sócrates prepara o terreno para Jesus, pois é quem prepara o terreno do martírio, ou seja, da valorização filosófica do auto-sacrifício como procedimento de defesa de uma crença, de uma doutrina. 

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O caminho que leva até Paulo e suas epístolas é o caminho que leva do sacrifício de Sócrates àquele de Jesus; Paulo, alimentado pela filosofia grega prévia (boa parte dela envolvida com a tarefa de fazer sentido do sacrifício de Sócrates, ou seja, fazer sentido da relação entre palavra e verdade, liberdade e política e assim por diante), reconfigura e reorganiza o sacrifício prévio de Sócrates em uma nova moldura doutrinal, tornada possível pelo sacrifício de Jesus; as estruturas teóricas de Platão e Paulo são montadas sobre os legados desses dois cadáveres célebres (condenados em julgamentos, executados com método, dentro de um ritual previamente estabelecido). 


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