2) Aquilo que Francis Bacon mais gosta no autorretrato de Rembrandt é o fato de perceber que os olhos não têm órbitas: um trabalho tardio de Rembrandt, contornos difusos, muito escuro. Carson diz que o olhar, aí, não está organizado do jeito habitual, a visão parecer emanar "silêncio"; e é nesse ponto do ensaio que ela alcança o problema geral, o cerne de sua argumentação (as variações sobre o direito de permanecer calado, e como essa "falta de voz" repercute na arte ao longo dos séculos).
3) Dando um salto inesperado - tão típico do ensaio, mais ainda do ensaio tal como praticado por Carson -, ela vai do silêncio de Rembrandt em direção ao silêncio de Paul Celan: um poema em louvor a Hölderlin, que termina com uma palavra intraduzível, repetida: "Pallaksch, Pallaksch". O silêncio, então, se articula com a tradução e com o intraduzível, se articula com a homenagem que Celan faz ao Hölderlin não apenas poeta, mas, sobretudo, tradutor (segundo as pessoas que o visitaram em sua torre, Hölderlin tinha inventado o termo Pallaksch e às vezes o usava para dizer Sim, às vezes para dizer Não).
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