1) Um dos principais atrativos da escrita de Roberto Calasso é a capacidade que tem de fazer do leitor uma sorte de participante. Isso ocorre - em grande medida a lição é de Walter Benjamin - muito mais por conta daquilo que não é dito do que por conta do que é apresentado pelo crítico. Ou seja, trabalhando a partir de lacunas e elipses, Calasso faz o leitor preencher os espaços vagos a partir de seu próprio repertório (como a antiga máxima que diz que a música se dá nos silêncios entre uma nota e outra).
2) No caso do seu último livro (que já comecei a comentar aqui), Calasso apresenta essa colagem de fragmentos que vai de 1933 a 1945, uma variedade de fragmentos que, no entanto, deixa uma série de personagens de fora. A escolha de Calasso é dialética, os fragmentos oscilam entre desesperados (Joseph Roth, Walter Benjamin) e celebratórios (Céline, André Gide), encerrando com a entrada de Vassili Grossman e do Exército Vermelho em Treblinka. Ou seja, ainda que não declare abertamente isso, Calasso encerra a segunda parte de seu livro preparando o caminho para a releitura da primeira (que faz a relação entre terrorismo e turismo nas últimas décadas).
3) Se durante a II Guerra a notícia dos campos era recebida com descrença (vide a história de Jan Karski), é possível dizer que parte da história da segunda metade do século XX é a história da revisão dessa descrença e da absorção dessa "notícia". É precisamente o problema que toca Calasso em seu livro ao falar do "turismo" e dos "turistas", e também o problema que aborda Didi-Huberman em Cascas: "em 2011, oito após a publicação de Images malgré tout, Georges Didi-Huberman vai ao campo de extermínio de Auschwitz-Birkenau, como um turista até certo ponto qualquer, com sua máquina fotográfica em punho. Esse tour ou deambulação pelo coração do que sobrou da máquina de morte nazista dará origem ao ensaio “Cascas” (Ecorces, no original), espécie de caderno de notas, ou ensaio autobiográfico, escrito a partir das fotografias registradas pelo filósofo" (fonte).
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