1) Três dos maiores escritores da primeira metade do século XX partem de uma premissa bastante semelhante, uma espécie de "poética da repetição", mas com resultados incrivelmente diversos: Borges (que repete Cervantes, que repete a tradição medieval de comentário e glosa), Joyce (que repete Homero, Vico) e Faulkner, que parece organizar sua poética da repetição em torno de outras três referências: Homero, a Bíblia e Shakespeare.
2) No caso de Light in August, romance que Faulkner publica em 1932, o título viria, segundo o próprio autor em entrevista, de uma ideia literal de "luz em agosto", ou certa "luz de agosto" (não tanto "leve em agosto", por exemplo) que surge lá pelo meio do mês, como que uma suspensão, uma ambiência específica (a Stimmung de Spitzer), que surge "dos velhos tempos clássicos", da Grécia e do Olimpo, "uma luminosidade mais antiga que nossa civilização cristã", propícia para o surgimento de faunos e deuses. Note-se, a propósito, que a primeira publicação de Faulkner, aos 21 anos, foi um poema intitulado "L'Après-midi d'un Faune" (repetição de Mallarmé) e que o título de seu romance de 1930, As I Lay Dying, vem direto da Odisseia de Homero, em referência à morte de Agamenon.
3) A Bíblia e Shakespeare frequentemente se encontram, em Faulkner, na ocasião da morte (que é também a ocasião da passagem, do legado, da herança, da repetição das gerações passadas em direção ao futuro - o peso do nome da família, do nome do pai ou do nome da mãe). Rei Lear, quando enlouquece, grita "matar, matar, matar, matar" e diante do cadáver da filha Cordélia, "nunca, nunca, nunca". O romance de Faulkner de 1936, Absalão, Absalão!, repete outra cena de desespero paterno: 2 Samuel 19, 1-5, quando Davi está diante do cadáver de seu filho e grita: "Absalão, Absalão! Meu filho, meu filho, meu filho". Quentin Compson, que já apareceu em 1929 em O som e a fúria, narra a história de Absalão, Absalão!, e sua narração é uma espécie de repetição daquilo que lhe foi contado por seu pai (assim como a história da queda da família Sutpen, de Absalão, é uma espécie de repetição da história da queda da família Compson).